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Os programas de compliance “fake”

Muitas empresas implantam iniciativas de conformidade que só existem no papel e que não têm qualquer efetividade, não encontrando nenhum eco na cultura da corporação, nem entre seus colaboradores


Implementar um programa de compliance requer energia e muito trabalho, além de causar impactos na cultura e nos processos internos das organizações. A Alta Administração tem que abraçar literalmente a causa e agir como exemplo, incentivando e disseminando o programa para seus colaboradores, clientes, fornecedores e sociedade em geral.


Entretanto, muitas empresas ao implementar um programa de compliance acreditam na seguinte frase do renomado Nicolau Maquiavel: “Algo deve mudar para que tudo continue como está”. Contratam colaboradores para atuar na implementação ou consultorias, investem dinheiro e tempo, mas no fundo querem que tudo continue como sempre foi. São os programas considerados “fake” ou “sham programs”.


“Sham programs” (ou programas de fachada ou programas de prateleira) são aqueles que só existem no papel e que não têm qualquer efetividade. Muitas companhias elaboram um código de conduta e até estruturam um programa complexo de integridade com a intenção de utilizá-los para mitigar sanções caso venham a ser condenadas.

Todavia, constata-se que tal programa não encontra qualquer eco na cultura da corporação, nem entre seus colaboradores, e não será considerado em eventual processo de investigação, podendo a empresa ser sancionada, por exemplo, com uma multa de até 20% sobre seu faturamento bruto – referente ao exercício anterior ao da instauração do processo administrativo -, quando incidir em um dos atos ilícitos definidos pela Lei Anticorrupção (Lei 12.846/2013).


Então, por qual motivo muitas empresas insistem em investir em programas de fachada ou de prateleira? Na maioria das vezes devido a uma imposição legal, pois necessitam participar de licitações públicas ou são concessionárias de serviços públicos. Outra motivação seria o marketing positivo que um programa de compliance pode causar no mercado, gerando mais faturamento para as empresas.


As organizações que optarem por programas “fake” também alegam que se eles forem efetivos a consequência será a responsabilização dos envolvidos em atos ilícitos ou antiéticos. Sendo que muitas vezes os envolvidos podem ser membros da Alta Direção, que não querem ser descobertos.


Além do mais, as organizações se beneficiam de muitos tipos de má conduta. Uma empresa pode preferir um programa de conformidade impotente se puder se beneficiar tanto da má conduta que ela não evita. A corrupção gera lucro, assim como a divisão do mercado. Então, por qual motivo ter um programa efetivo?


Fachada sem substância

A falta generalizada de confiança e segurança no compromisso de uma organização de “fazer a coisa certa” aumenta quando a administração, funcionários e/ou clientes acreditam que o programa de compliance é apenas uma fachada sem substância.


Muitas organizações não acreditam que os stakeholders reconheçam tais sutilezas. Felizmente, eles estão cada vez mais atentos sobre como as organizações são geridas e se os programas de compliance são de fato efetivos.


O novo capitalismo traz à tona a responsabilidade que as organizações possuem em relação a sociedade. Empresas que sofrem penalizações em decorrência de programas de fachada tendem a demitir colaboradores, fechar fábricas e escritórios. Tal situação afeta os negócios próximos a estes estabelecimentos, famílias ficam sem sustento, fornecedores perdem negócios e os clientes podem literalmente ficar sem seus produtos e/ou serviços.


Assim, é vital que as organizações assumam um compromisso firme com o compliance e a ética, implementando um programa que seja eficaz.


Artigo: Patricia Punder

Patricia Punder, advogada, é compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020.


Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patricia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil).


Artigo publicado no Law Innovation, 26 de julho/21.

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